Um trauma de parto pode deixar sequelas emocionais e até físicas. Lamentavelmente são ainda muitas as mulheres que passam por esta situação. Vamos perceber as causas e as consequências dum parto traumático.
O parto traumático é definido como “um evento que ocorre durante o trabalho de parto ou no momento do parto. Este envolve uma lesão física da mulher ou do recém-nascido. Esta lesão pode ser real ou simplesmente ser um medo profundo de que a mesma aconteça. Durante esse evento, a puérpera experimenta medo intenso, desamparo, perda de controle e horror”. (Zambaldi 2009)
As mulheres que tiveram um parto traumático também podem desenvolver sintomas ligados aos distúrbios de ansiedade e Transtorno do Stress Pós-Traumático (TSPT). Fobias relacionadas com o evento traumático (medo de médico, aversão a hospitais). Distúrbios alimentares como compulsão ou perda de apetite, distúrbios do sono. Também sintomas psicossomáticos tais como problemas de pele, cabelo ou digestivos, (gastrite). A vida sexual fica comprometida devido ás dores na região pélvica. São frequentes problemas com auto-estima devido às cicatrizes. Deprimida a mulher recorre ao isolamento, o que se refletem na sua vida familiar e social.
Experiências traumáticas
Algumas experiências durante o trabalho de parto trazem uma carga emocional que faz com que vivenciem o evento como psiquicamente traumático. Principalmente quando ocorrem complicações obstétricas, ou complicações neonatais. Também, a Cesariana ou outro procedimento de urgência, o uso de fórceps ou vácuo podem ajudar a que o parto seja visto como um evento traumático.
É comum os profissionais de saúde reconhecerem um parto traumático como um parto que levou a injúrias físicas para a mulher ou para o recém-nascido. Mas, o parto traumático ainda é pouco aceite e reconhecido como um evento psiquicamente traumático para a mulher.
Mesmo um parto considerado rotineiro pela equipe de saúde pode ser, para algumas mulheres, um parto traumático.
Está relacionado com a emoção sentida durante o trabalho de parto como o medo intenso de morrer ou medo intenso da morte do bebé. O facto de sentir dor intensa e prolongada ou perceber que a assistência da equipe de saúde é inadequada também interfere.
A falta de informação quanto ao procedimento a que está submetida dá-lhe a sensação de perda de controle. Por fim, uma experiência humilhante é outro fator que contribui para o trauma.
Após viver um parto traumático, algumas mulheres passam a apresentar recordações aflitivas do parto, em imagens, ideias, sonhos. Estes eventos levam a emoções que as obriga a evitar lugares, situações, pessoas que as façam relembrar o parto. Associado a esse quadro, também apresentam hiperexcitabilidade e entorpecimento afetivo, caracterizando-se como TSPT (Transtorno Stress Pós Traumático).
4 temas predominantes
No estudo conduzido por Cheryl Beck (2004), esta identificou 4 temas predominantes:
1) As mulheres tinham sensação de abandono e solidão, sentiam sua dignidade ferida e tinham pouco suporte. Consideravam o atendimento recebido no parto como “mecânico”, “arrogante”, “frio, “técnico” e sem “empatia”;
2) Consideravam falha a comunicação da equipe de saúde, pois discutiam entre eles sem dar as informações sobre o que estava a acontecer;
3) Quando percebiam que o atendimento da equipe de saúde era inadequado, passavam a temer pela sua vida e a vida do bebé;
4) A equipe de saúde considerava um parto de sucesso quando não havia complicações com a mãe ou o recém-nascido, sem dar importância á perceção da puérpera em relação ao parto.
No estudo de Ayres (2007), observou-se que, durante o parto, as mulheres tinham preocupações com o bebé, medo de morrer, pensamentos dissociativos, perda de controle e pouco entendimento do que lhes estava a acontecer.
Já Thomson e Downe (2008), no seu estudo qualitativo, observaram que as mulheres se referiam ao parto como uma violência, tortura ou abuso semelhante a um trauma por agressão física.
Experiência do TSPT
Neste estudo de Cheryl Beck (2004), as mulheres descreveram os seus depoimentos sobre a experiência do TSPT e nos relatos dessas mulheres predominavam os seguintes temas:
1) Durante o dia, as mulheres tinham flashbacks do parto traumático e, à noite, pesadelos. O evento passava-se como um filme na mente delas;
2) As mulheres descreveram ter apresentado experiências dissociativas durante o parto, como sentir-se paralisada, destacada do corpo e sem sentimentos. Uma delas ainda persistia com os sintomas;
3) Elas tinham necessidade marcante de entender o que aconteceu com elas e como foi o parto;
4) Muitas relatavam sentir raiva, ansiedade e depressão;
5) Elas tornaram-se emocionalmente distantes de seus filhos, evitavam estar com outras mães e crianças e passaram a temer ter outros filhos.
21,4% a 34% das mulheres referiram um parto traumático
Três estudos qualitativos e quatro quantitativos sobre o parto traumático mostram que sua prevalência varia de 21,4% a 34% e que a mulher apresenta, durante o trabalho de parto ou o parto, medo intenso de sua morte ou do bebé, além de impotência, desamparo e horror.
O parto traumático está relacionado a partos dolorosos, com procedimentos obstétricos de urgência e com assistência inadequada da equipe de saúde.
CONCLUSÃO: O parto traumático, não é um evento raro e traz consequências negativas para a vida da mulher, podendo inclusive apresentar TSPT. (ZAMBALDI, 2009)
Beck CT. Birth trauma in the eye of the beholder. Nurs Res. 2004a;53(1):28-35.
Ayres S. thoughts and emocions during traumatic birth: a qualitative study. Birth. 2007;34(3):253-63.
Thomson G, Downe S. Widening the trauma discourse: the link between childbirth and experience of abuse. J Psychosom Obstet Gynaecol. 2008;29(4):268-73.
ZAMBALDI, Carla Fonseca; CANTILINO, Amaury and SOUGEY, Everton Botelho. Parto traumático e transtorno de estresse pós-traumático: revisão da literatura. J. bras. psiquiatr. [online]. 2009, vol.58, n.4
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